terça-feira, 12 de outubro de 2010

A origem dos quiosques


"Diana Moreira viajou no tempo e fez como os avós: renegou a internet e entregou-se à pesquisa à moda antiga. Mergulhou de cabeça no Gabinete de Estudos Olissiponenses e descobriu a história dos quiosques. Em livros, pois claro.

Se lhe dissermos que rabiosque pode ter qualquer coisa a ver com quiosque, acredita? Não? Então leia com atenção: segundo Baltazar Caeiro, na sua obra Quiosques de Lisboa, o termo "quiosque" vem do francês "kiosque" que, por sua vez, derivou do persa "koushk" e do turco "kiouhk" que, para além de "pavilhão de jardim", significa... nádega. Está a ver a ligação?

Baltazar Caeiro refere que poderá estar relacionado com a forma como as pessoas se posicionavam em torno dos quiosques, de traseiros mais ou menos empinados, aglomerados em alegre socialização. O certo é que desde 1620 que os franceses os cultivam. Primeiro como coretos, para música, ou pequenos pavilhões de jardim, e só depois,, em 1865, com a explosão da Arte Nova, como forma de decoração das ruas, pequenas boutiques onde era possível comprar flores, tabaco, jornais e refrescos. Uns vaidosões, os franceses. A moda pegou e alastrou-se pela Europa. Portugal não ficou de fora e em 1869 as pequenas construções de estilo oriental, embelezadas pelo ferro torcido da Arte Nova, invadiram o país.

Primeiro no Rossio - o quiosque Elegante, apelidado de "Bóia" pelos operários e artesãos, como se fosse uma espécie de salvação contra a rotina do trabalho. Mais tarde seria rebaptizado pelo povo como o "quiosque dos libertários", por ser ponto de encontro dos progressistas do início do século XX. Seguiu-se o Passeio Público, na Avenida da Liberdade, a zona ribeirinha, com quiosques dedicados aos trabalhadores portuários, com torresmos e afins, e finalmente nos jardins e outros pontos centrais de Lisboa antiga.

A população fervilhava em torno dos "kioskos": antes ou depois do trabalho, para descontrair, e aos fins-de-semana, em passeio com a família. Bebia-se chocolate quente e vinho a copo, gasosas, capilé, misturas de anis, caramelo e água, e cerveja de botija. Até que, em 1900, alguns quiosques começaram a vender sorvetes. Aí foi a verdadeira loucura. No terreiro do Paço havia até alguns que forneciam peixe frito e azeitonas aos mais destemidos.

Os quiosques, segundo Claude Bony, em Uma História dos Quiosques, funcionavam como uma versão mais pequena e barata do café, taberna e leitaria, mais próxima do cliente e acessível a todos os bolsos. E se no início eram os operários e pequena burguesia que os frequentavam, rapidamente os artistas, elite e intelectual e, claro, os estudantes, tomaram conta dos quiosques para beber copos e partilhar ideias.

O primeiro pedido de instalação de um quiosque em Lisboa data de 1867 e foi feito à Câmara pelo artista e escritos D. Thomaz de Mello. A licença só sairia um ano depois, com a proposta da Câmara de se instalar quiosques pela cidade, como "forma de embelezamento e coisa útil".

Mas a maravilha dos quiosques vai mais além. Foi graças a um deles que nasceu a primeira esplanada em Lisboa, na Travessa da Glória. Estava dado o mote para uma das melhores actividades sociais. Daí a nada a mania de pôr mesas em frente aos cafés espalhou-se e rapidamente todos podiam aproveitar o ar livre, de copo na mão ou prato cheio.
Hoje, e depois de muitos anos de abandono, os quiosques voltaram a embelezar e alimentar as zonas centrais de Lisboa, graças ao plano de recuperação de jardins e espaços verdes da Câmara de Lisboa. E nós agradecemos. É que esplanadas, petiscos e bebidas nunca são de mais."

Time Out, 6 de Outubro 2010

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